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#5: Lavar nariz também é ciência..
e você pode estar “fazendo ciência” errado
EDIÇÃO #4
The Peds Journal
A newsletter da pediatria baseada em evidência - com leveza, profundidade e algumas risadas, por que não?!
Como diria sua avó, “é como diz o ditado…”:
Seu paciente pode até não estar conseguindo respirar pelo nariz… mas com o The Peds Journal você, pediatra, não tem desculpa pra não respirar evidência científica rsrs (ah, deem um desconto, o estoque de piadas da nossa estagiária é completamente limitado, tadinha… 🤣)
🧠 Como você vai ficar mais inteligente hoje
Tema: Lavagem nasal em pediatria: quando, como e por quê
Fonte: Guia Prático de Atualização nº 120, publicado pela Sociedade Brasileira de Pediatria
(Departamento Científico de Otorrinolaringologia) em 30 de novembro de 2023
Link para acesso: Clique aqui para ler o documento completo
Por que você deveria se importar?
Você acha que sabe, mas…
Soro demais ≠ Cuidado demais
Quando Prescrever e Quando Ter mais Cautela
Na prática: volume, posição, técnica e soluções
Em 1 minuto: o que você precisa lembrar
Por que você deveria se importar?
Apenas porque prescrever lavagem nasal é praticamente um reflexo condicionado de qualquer pediatra rs. Bebê espirrou? Lava. Está com obstrução nasal? Lava. Resfriado? Lava também.
A lavagem nasal é, sem exagero, uma das condutas mais prescritas em consultório pediátrico. Mas ainda é cercada de dúvidas, variações e um certo “empirismo”.O Guia da SBP veio justamente para mudar isso: organiza, esclarece e padroniza o que a gente precisa saber, de forma prática, segura e baseada em evidência.
Quando feita corretamente, a lavagem nasal:
Reduz sintomas,
Evita uso excessivo de medicamentos,
Melhora qualidade de vida,
E é aliada potente no manejo de IVAS, rinite, sinusite e até doenças respiratórias crônicas.
Então bora aprender a fazer (e prescrever) bem direitinho..
Você acha que sabe, mas… 🤔
A lavagem nasal não é uma simples "jogadinha de soro no narizinho”. Não basta dizer “usa soro”. A eficácia da lavagem depende:
Da solução escolhida,
Do dispositivo utilizado,
Da frequência adequada,
E principalmente da técnica correta.
E sim, existem contraindicações, reações adversas, e até cuidados específicos para lactentes e crianças com condições anatômicas especiais.
A SBP deixa claro: a lavagem nasal é extremamente útil e importante, mas precisa ser personalizada. O que funciona pra um paciente pode não funcionar pra outro, e orientação mal feita pode causar desconforto, medo ou até complicações.
Outro ponto de atenção é: não existe um “volume universal” pra lavagem nasal. Cada faixa etária tem seu limite seguro e eficaz. A SBP define isso com mais clareza nesse documento.
Não seja a/o atrasada(o) do ENEM…

Agosto chegou, e com ele chega também, todos os anos, o INgresso, nosso evento presencial do PDC. Um sábado em que nos reunimos para falar de pediatria, claro, mas também de outras habilidades fundamentais para que tenhamos sucesso na CARREIRA como pediatras..
O evento vai acontecer no dia 23 de Agosto, no Hotel Pullman Ibirapuera, em São Paulo, e a notícia boa é que ainda dá pra garantir a sua presença! Juro, ninguém tem coração pros atrasados do ENEM, não seja um deles kkkkkk (eu fico desesperada só de ver as fotos. Credo.)
Ah, claro, você pode conhecer melhor o evento e a programação, com todos os palestrantes, clicando aqui. Bora, que depois que passa não adianta chorar…
Soro demais ≠ Cuidado demais
Não sei vocês, mas onde eu fui criada como pediatra, era comum a ideia de que “quanto mais soro, melhor o efeito”.. mas na prática (embasada pela ciência) não é beeeem assim. Dividindo por faixa etária, a SBP recomenda o seguinte:

Reparem que os dispositivos são recomendados de acordo com a faixa etária.. as famosas “garrafinhas”, por exemplo, só são indicadas após os 2 anos de idade, enquanto a lavagem e o conta-gotas NÃO SÃO recomendados depois que a criança passa de 6 meses…
Ah, e é importante lembrar que a lavagem nasal não substitui a avaliação clínica nem resolve todo quadro respiratório, ta?! Mas de fato, uma prescrição correta pode “fazer milagres” rs
Quando Prescrever e Quando Ter mais Cautela
✅ Indicações claras e bem fundamentadas:
Rinite alérgica ou não alérgica
IVAS (como adjuvante para remoção de secreções)
Rinossinusites agudas e crônicas
Infecções nasais perinatais (ex: rinite sifilítica)
Higiene nasal em doenças respiratórias crônicas (ex: fibrose cística)
Pós-operatório de cirurgias nasais (com indicação médica)
Epistaxes
❌ Contraindicações relativas (devem sempre ser avaliadas pelo médico):
Suspeita de obstrução nasal total por corpo estranho
Pacientes com disfagia e risco de aspiração
Fissura palatina não corrigida
Crianças com defeitos de base de crânio
Fraturas de face
Vale repetir: broncoaspiração é uma complicação séria, especialmente em lactentes. É por isso que a técnica e a posição da criança importam tanto quanto o volume. E é por isso que vamos falar delas agora (mulher, tu é ansiosa demais, se acalme, bença!)
Na prática: volume, posição, técnica e soluções
Bom, acho que a teoria já está clara: lavagem nasal tem indicação, contraindicação e precisa de critério. Mas como transformar tudo isso em uma prescrição segura e efetiva no consultório?
É aqui que a coisa ganha forma, ou melhor, ganha volume, posição adequada, técnica gentil e escolha consciente da solução (rs). Parece simples (e deve ser simples mesmo), mas somos médicos e precisamos entender o “rigor técnico” por trás da prescrição..
Se a gente orienta bem, evita complicações. Se orienta mal (ou não orienta), pode gerar desconforto, broncoaspiração, epistaxe… e ainda sentir a culpa pela piora do quadro.
Então, como diria Jack, vamos por partes (é impressionante que, a cada edição que passa, eu deixo mais escrachado o fato de que nasci a long time ago kkkk), tudo com base no que a SBP recomenda, claro.
1. Solução:
Preferência por solução isotônica (0,9%) sem conservantes - incluindo soro caseiro (9g de NaCl para 1L de água filtrada e fervida)
Soluções Hipertônicas (≥3%) podem ser úteis em casos específicos de congestão nasal acentuada, mas com maior risco de ardência - lembre-se de orientar isso, caso prescrevam!
No nosso mini-mundo, não se recomenda adicionar medicamentos à solução utilizada na lavagem nasal. Corticoides (dexametasona) e antibióticos (gentamicina e mupirocina), frequentemente adicionados, são feitos de forma “off-label”, e podem estar associados a efeitos sistêmicos - ATENÇÃO!
2. Técnica:
Dispositivos existentes hoje: Conta-gotas; Seringas; Flaconetes (especialmente em RN internados na UTIN); Peras de aspiração, aspiradores nasais, aspiradores elétricos; Chaleirinha; Garrafas compressíveis; Spray; Spray em jato contínuo
Aplicar com leve inclinação da cabeça para o lado oposto da narina que será lavada.
Ao fazer a aplicação, a criança deve estar de preferência sentada e com a boca aberta (bebês < 6 meses podem ser deitados para a realização do procedimento, mas com a cabeceira elevada a pelo menos 30 graus)
Aplicar suavemente - nada de “jato de lava a jato”, é um nariz, não uma calçada suja, pelo amor
3. Frequência:
Até 3x/dia, podendo ser aumentada transitoriamente conforme a necessidade clínica da criança
4. Reações Esperadas:
Leve espirro, desconforto transitório
Efeitos adversos: desconforto local (ardência, prurido, queimação), lacrimejamento, epistaxe, otalgia e cefaleia são os mais apontados
E claro, tudo isso só funciona se quem for aplicar (cuidador, responsável, equipe de saúde) estiver bem orientado... Técnica mal orientada pode virar trauma, e aí não dá pra culpar a criança, né?
Em 1 minuto: o que você precisa lembrar ⏱️
Lavagem nasal é terapêutica, não decorativa: tem indicação, técnica correta e limites de volume por faixa etária.
Solução salina isotônica sem conservantes é a primeira escolha (inclusive o bom e velho soro caseiro – desde que bem preparado!).
Evite soluções com medicamentos adicionados (como corticoides e antibióticos) – uso off-label, sem evidência sólida e com riscos.
Lactentes < 6 meses: preferir conta-gotas, flaconetes ou 1mL com seringa. Cabeceira elevada a 30° se bebê deitado.
6 meses a 2 anos: pode usar jato ou seringa (3 a 20 mL). Nada de alto volume nem conta-gotas.
> 2 anos: pode usar garrafinhas e chaleirinhas. Alto volume permitido (120–240 mL), mas com técnica gentil.
Ideal fazer com a criança sentada e com a boca aberta sempre que possível (pedir pra criança falar "AAAAA" ou "KKKKK" porque isso ajuda a evitar broncoaspiração).
Frequência? Até 3x/dia, podendo aumentar conforme o caso.
Contraindicações relativas: obstrução nasal total, fissura palatina, risco de aspiração, fraturas de face etc.
Efeitos adversos existem, mas são raros: ardência, espirro, epistaxe leve. Técnica bem feita evita boa parte disso!
Se você chegou até aqui…
Parabéns! Seu raciocínio clínico sobre lavagem nasal já tá mais calibrado que frasco novo de soro com data de validade em dia kkk. E que bom, porque se tem uma coisa que o pediatra precisa dominar, é a arte de indicar o que parece simples com o “peso” de quem entende a fundo a ciência que ta por trás...
Nos vemos semana que vem, nesse mesmo bat-canal.. e pode ser que a gente se veja no INgresso 2025 também, caso você decida começar a frequentar eventos de pediatria que não custam um rim e não tenham perrengues de filas quilométricas, salas lotadas e falta de ar condicionado rsrsrs (não vou dizer que evento foi esse, mas se vc pegou a referência, minha irmã.. #eutambémfui #eutambémtava)
E por fim, você já sabe, mas não custa reforçar…
Conhecimento bom é aquele que a gente divide (de preferência, tomando um cafezinho BPA free ☕, né?), então deixe de ser egoísta.. compartilhe a The Peds Journal com seus colegas, residentes, e até com aquele amigo que prescreve lavagem nasal “de acordo com o feeling” rs.
Beijinhos científicos,
Gabi do PDC