#4: a polêmica do “cheirinho de bebê”

Rótulo bonito, química duvidosa.. vem entender mais

EDIÇÃO #4

The Peds Journal

A newsletter da pediatria baseada em evidência - com leveza, profundidade e algumas risadas, por que não?!

Sair do banho cheirando a lavanda, camomila, amêndoas e… formaldeído rs

Parece zoeira, mas tá nos rótulos... Se você ainda acredita que “produto infantil” é sinônimo de “seguro”, essa edição vai te mostrar por que o pediatra precisa virar leitor profissional de composição química SIM (sem o trauma da bioquímica, prometo 😅)

🧠 Como você vai ficar mais inteligente hoje

Tema: Cosméticos na infância: importância da leitura de rótulos como um hábito

Fonte: Manual de Orientação nº 218, publicado pela Sociedade Brasileira de Pediatria (Departamento Científico de Dermatologia) em 10 de julho de 2025

  • Por que você deveria se importar?

  • Você acha que sabe, mas…

  • Tudo que reluz é ouro? Nem tudo.

  • O que precisamos procurar nos rótulos (e evitar)

  • E na prática, o que eu faço com isso?

  • Em 1 minuto: o que você precisa lembrar

Por que você deveria se importar?

Os cosméticos estão entre os itens mais presentes na rotina da criança. Desde os primeiros dias de vida (quem já fez consulta pré-natal sabe que isso é extremamente questionado pelos pais..), os bebês entram em contato com sabonetes, shampoos, loções, lenços umedecidos e “coisinhas cheirosas” em geral.

O problema? A pele da criança é imatura, a regulação dos cosméticos é meio “largada”, e o marketing, infelizmente, tem mais força que a toxicologia rs.

Resultado: produtos com apelo visual e olfativo, mas com fórmulas que podem representar risco real à saúde do bebê e da criança.

Calma.. A SBP não está dizendo para abolir o banho e os cuidados.. está apenas dizendo que precisamos ser críticos com o que colocamos na pele da criança, e que essa crítica deve começar pela leitura de rótulos. É isso que vamos discutir aqui hoje.

🤯 Você acha que sabe, mas…

Nem tudo que está na prateleira é seguro.. e nem tudo que parece “feito para bebê” é, de fato, adequado para os nossos mini queridos.

A regulamentação dos cosméticos no Brasil (inclusive os destinados ao público infantil) é de responsabilidade da ANVISA, por meio de diversas Resoluções da Diretoria Colegiada (RDC).

Essas normativas definem os critérios técnicos exigidos para a regularização de cosméticos, incluindo:

  • Limites e restrições para substâncias ativas e aditivos;

  • Exigências de avaliação de segurança dos produtos;

  • Regras claras para rotulagem, especialmente em produtos infantis.

A legislação também estabelece a obrigatoriedade da declaração completa dos ingredientes nos rótulos (em português), utilizando a nomenclatura INCI (International Nomenclature of Cosmetic Ingredients), que nada mais é do que um sistema padronizado internacional que permite a identificação precisa das substâncias cosméticas.

Tudo isso visando transparência e melhor compreensão tanto por profissionais quanto por consumidores. MAS… mesmo com essas regulamentações, a SBP ressalta que a simples presença no mercado não deve ser interpretada como selo de segurança. Por isso o papel do pediatra em entender esses critérios, conhecer os limites da regulação vigente e complementar o cuidado com orientação ativa e vigilância crítica é fundamental.

Tudo que reluz é ouro? Nem tudo.

Por conta dessa questão que acabamos de ver, sobre a real segurança dos cosméticos infantis, produtos com apelo mais “natural” tem sido muito buscados pelos cuidadores e pediatras…

E claro, lei da oferta e demanda, tem crescido no mercado a quantidade de cosméticos infantis rotulados como “naturais”, “orgânicos” ou até “veganos”. Seria tudo, né?

Pooorém.. o Manual da SBP alerta: esses termos não são garantia de segurança toxicológica ou dermatológica, especialmente na pele imatura de uma criança. Vamos entender melhor o que cada um deles significa:

A SBP reforça que esses rótulos, embora atrativos, são muitas vezes estratégias de marketing (olha ele aí…), e não significam que o produto é adequado para uso infantil.

Daí a importância de a gente orientar as famílias a priorizar fórmulas seguras e bem avaliadas, independentemente do quão bom e criativo é o apelo comercial presente no rótulo (porque sabemos que aahhh, eles são bons nisso).

“Ta.. já entendi que tem que ler rótulo. Mas o que eu procuro nesse rótulo pra dizer pra família: “FUJA, BINO, É UMA CILADA?!”

É o que vamos ver agorinha.

O que precisamos procurar nos rótulos (e evitar)

Pela primeira vez, a SBP trouxe uma lista de substâncias com potencial tóxico, alergênico ou de agir como disruptor endócrino - muitas ainda permitidas em muitos cosméticos infantis (para nooooossa alegria.. só que ao contrário)

Se você entendeu essa referência, ta na hora de renovar o botox, minha amiga kkkkk)

A preocupação é especialmente relevante quando se considera a exposição cumulativa e precoce, que pode provocar efeitos adversos a longo prazo, mesmo em baixas concentrações…

Então, sem mais delongas, os principais ingredientes questionáveis destacados pelo documento, com possíveis efeitos adversos, são:

Ingrediente

Função Cosmética

Potenciais Riscos à Saúde

Alumínio

Antiperspirante, corante, conservante

A principal preocupação gira em torno da possibilidade de disrupção endócrina, com efeito estrogênico - proibido para <12 anos!

Parabenos (methyl-, propyl-, etc.)

Conservantes

Ação estrogênica; possível desregulação endócrina e efeitos sobre desenvolvimento puberal

Ftalatos (ex: DEP)

Fixador de fragrância

Efeitos reprodutivos, neurodesenvolvimento e desregulação hormonal

Formaldeído e liberadores

Conservantes

Potencial carcinogênico; alergias cutâneas e respiratórias

Triclosan

Antisséptico

Potencial disruptor endócrino; resistência bacteriana

Lauril Sulfato de Sódio (SLS)

Surfactante, agente de limpeza

Irritação cutânea e ocular, alteração da barreira cutânea

BHT

Antioxidante

Riscos de toxicidade hepática e possível ação hormonal

Fenoxietanol

Conservante

Potencial tóxico hepático e neurológico, risco de dermatite

Metilisotiazolinona

Conservante

Elevado potencial alergênico

Filtros químicos (oxibenzona, octinoxato, octocrileno)

Fotoproteção

Disruptores endócrinos; risco de alergia

“Parfum” (Fragrâncias sintéticas)

Aditivo sensorial

Alergias, dermatites de contato, possíveis efeitos respiratórios

E na prática, o que eu faço com isso? 👀

Bom, você já sabe que a pele da criança não é uma versão reduzida da pele do adulto, e que essa vulnerabilidade exige atenção redobrada quando o assunto é “produtinho” (principalmente aqueles que são aplicados diariamente, né?)

Você também viu hoje que o fato de um cosmético estar no mercado não significa que ele seja inofensivo, e que nem “vegano”, nem “natural” são sinônimos de segurança. E que infelizmente, muitos ingredientes com potencial alergênico, tóxico ou disruptor endócrino seguem permitidos e sendo utilizados.

Por isso, cabe a nós, profissionais, reconhecermos e orientarmos. Em tempos de “marketing verde” (brega, mas é o que é rs), embalagens sensoriais e promessas perfumadas, o pediatra precisa ser uma voz técnica e crítica, capaz de traduzir ciência em orientação prática para as famílias.

Então bora transformar essa leitura em ação?

  • Oriente os pais sobre os riscos de exposição precoce e cumulativa às substâncias citadas pela SBP;

  • Reforce que “natural/vegano/verde” ≠ seguro, e “infantil” ≠ inofensivo;

  • Ajude a escolher produtos com fórmulas simples, sem fragrância e com pH compatível com a pele infantil;

  • Avalie reações cutâneas recorrentes com olhar crítico: o vilão pode estar no shampoo, no hidratante, no “cheirinho pós banho"... e muitas vezes a família nem imagina que isso pode ser prejudicial;

  • Estimule o hábito da leitura de rótulos como parte do cuidado com a criança;

  • Se possível, indique marcas com boa “reputação toxicológica”rs ou pelo menos, sem “terror químico” na composição.

⏱ Em 1 minuto: o que você precisa lembrar

A pele da criança é mais fina, permeável e imatura, e portanto absorve mais e reage mais.

A regulação dos cosméticos infantis existe, mas está longe de blindar o produto que chega até a prateleira.

“Natural”, “vegano” e “orgânico” são, 99% das vezes, termos de marketing, não de segurança dermatológica.

Parabenos, ftalatos, formaldeído, LSS, fragrâncias sintéticas, dentre outros.. são ingredientes com potencial alergênico, irritativo ou hormonal, e sim, ainda estão por aí, inclusive em cosméticos “para bebê”.

O pediatra precisa ser leitor de rótulo e orientador de famílias.

Se você chegou até aqui…

Parabéns, seu olhar clínico agora enxerga até o que está em letras miúdas nos frascos em gôndolas de farmácias e supermercados… E que bom, porque interpretar rótulo é mais pediatria do que parece.

Na próxima edição, vamos discutir outro tema atual e que gera dúvidas no dia a dia.. será que vem mais polêmica por aí? rs na próxima edição saberemos

Mas até lá, compartilhe o The Peds Journal com quem também vive entre consultas, gorfadas e banhos aromáticos duvidosos kkk

Porque conhecimento bom é aquele que a gente divide! (de preferência, com o frasco virado para o lado da composição 🤭)