#7: DMPB: menos é mais (e melhor)

Por que suporte e paciência são mais eficazes que antivirais sem evidência

 EDIÇÃO #7

The Peds Journal

A newsletter da pediatria baseada em evidência - com leveza, profundidade e algumas risadas, por que não?!

Quem é raiz, não aceita qualquer coisinha “off-label” não, rs

O paciente pode até estar com bolha na mão, afta na boca e febre que não passa… Mas somos nós, pediatras, que precisamos evitar “infecção” por condutas sem evidência. Bom, pelo menos com o The Peds Journal a gente já tá na metade do caminho.

🧠 Como você vai ficar mais inteligente hoje

Tema: Tratamento da doença mão-pé-boca em crianças

Fonte: Nota de Alerta nº 219, Sociedade Brasileira de Pediatria, publicado em 15 de julho de 2025 (clique aqui para acessar o documento na íntegra)

  • Por que você deveria se importar?

  • Você acha que sabe, mas…

  • O que é, afinal, essa tal DMPB?

  • Manejo clínico: o que fazer (e o que não fazer!)

  • Uso de Medicações “Off-label”: um alerta necessário

  • Em 1 minuto: o que você precisa lembrar

Por que você deveria se importar?

Porque a Doença Mão-Pé-Boca (DMPB) é aquele clássico “ninguém chama, mas todo mundo aparece”: frequente, contagiosa e com potencial de causar surtos, especialmente em crianças menores de 5 anos. Apesar de, na maioria dos casos, ser autolimitada, apresentações atípicas e complicações, especialmente com o Enterovírus A71 precisam da nossa atenção redobrada.

Por conta das possíveis apresentações mais “agressivas” da DMPB, a discussão sobre possíveis tratamentos antivirais tem surgido entre os colegas pediatras nos últimos anos.. E é justamente por isso que você tá lendo isso aqui hoje.

Vou explicar: a SBP publicou, no dia 15 de Julho de 2025, uma Nota de Alerta sobre a DMPB, não porque algum conceito em relação à doença mudou, mas sim para se POSICIONAR com relação aos tratamentos “off-label” que vem sendo prescritos por aí (spoiler: sem evidência)

🤯 Você acha que sabe, mas…

Primeiramente: muita gente ainda confunde DMPB com outras doenças exantemáticas na hora de fazer o diagnóstico.. dentre elas varicela, estomatite herpética, até reações alérgicas.

Só que aí, pensa comigo.. um diagnóstico incorreto, na imensa maioria das vezes vai gerar o que? Isso mesmo, um tratamento incorreto.

Então tem muito paciente ganhando antibiótico (aquele famoso “pra garantir” que a gente odeia kkkrying), tratamentos tópicos aleatórios, e se liga, pequeno gafanhoto, que sempre dá pra piorar: alguns profissionais insistem em prescrever antivirais que não têm evidência para a doença ou medicamentos off-label perigosos.

Tudo isso quando, na verdade, o manejo da DMPB é basicamente suporte, hidratação e paciência (a parte mais difícil, acreditem) e a prevenção de surtos passa por medidas simples, mas que precisam ser lembradas e reforçadas.

O que é, afinal, essa tal DMPB?

Como vimos, a DMPB é uma infecção viral causada principalmente por enterovírus como Coxsackie A6 e Enterovírus A71 (esse normalmente relacionado a sintomas mais graves).

Os sintomas clássicos incluem febre baixa a moderada, úlceras dolorosas na cavidade oral e exantema vesicular nas mãos, pés e boca (daí o nome.. gênio, né? O óbvio precisa ser dito, nunca esqueça).

Às vezes, nádegas e cotovelos também podem estar acometidos pelo exantema, mas isso é mais comum nos menores de dois anos. O quadro costuma durar de 7 a 10 dias e geralmente se resolve sem complicações.

Casos graves, embora raros, podem envolver complicações neurológicas e precisam de atenção hospitalar imediata - é o tipo de coisa que não da pra comer bola, não…

Manejo clínico: o que fazer (e o que não fazer!)

O tratamento da DMPB é um só: suporte à criança. Seja com sintomáticos pra febre e dor, seja com hidratação adequada (parece óbvio, mas deve ser bem difícil se manter hidratado com a boca cheia de lesões, né?) e, não menos importante, afastamento da criança do ambiente escolar. E até quando precisa mantê-la afastada? Até a resolução das lesões E da febre.

Agora, sinceramente, quando se trata da DMPB, mais importante do que “o que fazer” é o que NÃO fazer. NÃO é pra prescrever, pra um paciente com DMPB: antibióticos, antifúngicos, corticoides (nem sistêmico, nem tópico) ou antivirais.

Aqui, atenção pra uma coisa: existe um antiviral que está sendo estudado fora do Brasil, uma medicação PARECE ter efeito para o tratamento dos enterovírus, chamado Pleconaril, ms que ainda não é rotina em diretrizes internacionais porque precisa de mais estudos…

De novo, parece óbvio falar, mas é preciso evitar medicamentos que não tenham indicação clara pra faixa etária pediátrica.

Então, sim.. eu sei que é difícil orientar que é “só uma virose” e que a gente vai hidratar com dipirona, água (se tudo correr bem, via oral) e paciência. Mas no Juramento de Hipócrates diz que “primeiro, não cause mal”. E prescrever pra “agradar família” pode causar bastante mal.

Sejamos firmes nas nossas convicções com relação à condutas embasadas e empáticos e mansos nas explicações do porquê. Esse é o segredo.

Uso de Medicações “Off-label”: um alerta necessário

Crianças não são adultos pequenos. Disso vocês já sabem. Mas sério: a farmacocinética e a farmacodinâmica são bastante diferentes entre crianças e adultos.

E que fique claro: os enterovírus, causadores da DMPB carecem dos alvos moleculares necessários para a ação do aciclovir, por isso “acooooorda, menina!”, o Aciclovir é farmacologicamente ineficaz nessa doença!

Além disso, medicamentos off-label sem respaldo científico aumentam risco de toxicidade, reações adversas e até complicações graves.

Por isso, a nota reforça (e nós aplaudimos de pé): relatos isolados baseados em experiência pessoal NÃO JUSTIFICAM o uso rotineiro. Cada prescrição deve ser baseada em evidência e segurança, principalmente quando o assunto é criança..

⏱ Em 1 minuto: o que você precisa lembrar

DMPB é viral, autolimitada e, na maioria das vezes, benigna.

Coxsackie A6 e Enterovírus A71 são os principais vilões.

Diagnóstico é clínico, não precisa de exames na rotina.

Manejo = suporte + hidratação + afastamento até melhora.

Nada de antibióticos, antifúngicos e/ou antivirais (incluindo Aciclovir) sem indicação, ok?

E sobre o uso off-label, é bem simples: NÃO FAÇA rs

Se você chegou até aqui, saiba: seu raciocínio clínico agora está mais protegido que criança que não vai na creche… rs

Brincadeiras à parte, lembre-se: a doença mão-pé-boca é autolimitada na maioria dos casos, mas seu manejo consciente é essencial para evitar complicações e intervenções desnecessárias.. e, cá entre nós: também pra evitar aquela receita de aciclovir que não faz o menor sentido aqui.

Na próxima edição, seguimos mergulhando em temas do dia a dia pediátrico que exigem decisões rápidas, mas baseadas em evidência. Quem sabe a gente não explora mais umas pérolas das notas de alerta da SBP?

Enquanto isso.. compartilha o The Peds Journal com seus colegas e residentes, porque conhecimento bom é conhecimento que circula (igual virose em escolinha, mas com efeitos bem melhores 😅)

E nunca esqueça: orientar, explicar e acalmar a família diante da DMPB é tão importante quanto tratar os sintomas. No fim, o melhor remédio ainda é a informação bem dada, e nisso, a gente manda muito bem, modéstia a parte rs

Beijinhos científicos,

Gabi do PDC